quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Resposta ao texto do amigo

Olá gente!
Aqui estou eu novamente e desta vez venho responder a um fervoroso e instigante debate fomentado no blog do meu amigo Cássio, que por sinal está muito legal!
Quem tiver a curiosidade de ler o texto para entender melhor do que se trata a nossa discussão é só acessar: http://locomotivaabstrata.blogspot.com/2010/10/justo-questionamento-justica.html#comments
Gostei muito do seu texto, mas tenho que fazer algumas considerações... Ninguém mandou você perguntar o que eu acho!!hehe
Concordo que não existe um conceito único e próprio de justiça, uma vez que em todo mundo existem culturas, pessoas, tribos e povos com construções históricas e ideológicas diversas, e o justo torna-se muito mais amplo e relativo. O Estado tenta de alguma forma unificar este conceito em busca da preservação de uma "ordem". Uma tentativa que de algum modo garante alguns "direitos" aos cidadãos. No entanto, será essa a forma mais eficaz? Vale apena reprimir todos os tipos de ideias e posicionamentos para manter a "tranqüilidade" do país?? Este ponto colocado por você é muito relevante dentro de uma análise sobre a justiça promovida pelo Estado. Tomando como o exemplo a realidade mais próxima, a situação da justiça brasileira. Será que a gloriosa frase “Ordem e Progresso” condiz com o que vivemos? E de fato ela é válida pra uma população se manter? Que "ordem" e que "progresso" é esse que obriga índios a manterem engenheiros, médicos e outras pessoas como reféns em troca de comida, remédio, e todo tipo de assistência básica? Que privilegia aqueles que têm os melhores carros, casas e os melhores diplomas e trata os mais pobres com "esmolas assistencialistas"? E trata criminosos como animais perigosos, que entram na cadeia sem nenhuma perspectiva de vida e saem com menos dignidade ainda, marcados pelo preconceito e o abandono social? Existe justiça mesmo? E diante disso é importantíssimo frisar que o conceito do que é justiça não vem inscrito em um código genético, mas é formado e incorporado do contexto social de cada um, somado às conclusões em que o próprio sujeito tira do que vive. E apesar de gostar do seu texto, pergunto-te: se não existe uma verdade sobre o que é justo, se os seres humanos possuem julgamentos muito particulares, o que é certo e o que é errado? Se a justiça, segundo você, não possui uma conceituação exata então não há como impor um julgamento dos atos certos e errados, não acha? No Brasil a poligamia é crime, para os mulçumanos é parte de seus costumes. Em alguns povos, sacrificam-se pessoas em nomes dos deuses, em outros matar pessoas é crime e pode levar até mesmo à cadeira elétrica. Para aqueles que seguem a religião Testemunhas de Jeová não é permitido a transfusão sanguínea, para as outras religiões isso é um atentado contra a vida. Para a ciência as células-tronco retiradas dos embriões é uma possibilidade de salvar vidas, para os religiosos significa o assassinato de alguém. Será que dá mesmo pra julgar a atitude dos outros segundo o que eu acredito que é certo? E não venho através das minhas colocações, posicionar-me a favor de nenhum grupo religioso ou político. Apenas quero criar mais e mais questões para pensarmos. As soluções “justas” que um Estado propõe nem sempre servem para todos. Fato importante para analisar principalmente neste período eleitoral que estamos vivendo. E já que toquei neste assunto, gostaria de contrariá-lo em outro ponto, não acho que a anarquia seja sinônimo de caos, pelo contrário, acho uma forma de ideologia política até organizada demais. O problema é que para chegarmos até ela temos que estar preparados e amadurecidos, e isso leva tempo, o mesmo tempo que o capitalismo levou para se tornar império produzindo sujeitos que o fortaleça. Uma sociedade sem Estado é possível desde que se haja respeito sobre as diferenças, desde que o estranho não seja mais visto como um adversário, mas como parte de um colorido. Sei que posso estar sendo um tanto idealista, mas mais uma vez tenho que discordar e concordar em parte de você. Aqui, mesmo que de uma forma mínima, luto por uma causa que de alguma forma vai te afetar e afetar aqueles que irão ler meu texto. Posso não provocar nenhum tipo de revolução, nem mudar a estrutura social e política, mas com certeza você ou qualquer outra pessoa irá pensar nem que seja um pouco no que escrevi aqui, ou pelo menos iram se sentir um pouco incomodados. E o que você fala sobre não buscar defender alguma questão em troca de paz, parece-me um tanto equivocado. Pode esta última também ser uma causa pela qual lutamos, e deixar de lado aquilo que acreditamos é simplesmente desistir de nós mesmos.
De maneira nenhuma tenho a intenção de impor meu ponto de vista de forma prepotente e ditatorial, só quero expor o que penso para que, quem sabe, possamos criar novas ideias.
Um abraço!

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Loucura (?) e alguns rastros de Poesia (!)






No mês de junho eu e alguns amigos, em busca de material para a aprensentação de um trabalho, fomos ao Rio de Janeiro conhecer o Museu Imagens do Inconsciente, fundado pela Drª Nise da Silveira. Um grande projeto que marcou o a história da saúde mental no Brasil, fazendo uma releitura das práticas manicomiais até então instituídas.
Nise foi a única mulher a se formar na Faculdade de Medicina da Bahia em 1926. Especializou-se em psiquiatria e prestou concurso para a área. Durante o governo de Getúlio Vargas foi denunciada por possuir obras marxistas, no entanto apenas apreciava a ideologia e nunca teve nenhum envolvimento com o movimento de Prestes. Foi no presídio que conheceu Graciliano Ramos e a partir desta experiência tornou-se uma das personagens de seu livro, "Mémorias do Cárcere". Na volta ao serviço público no Centro Psiquiátrico Nacional inciou sua revolução. Ao criticar as práticas da psiquiatria clássica como eletrochoques, choques de insulina e utilização indiscriminada de medicação, Nise foi deslocada para um setor ignorado pelos médicos, onde os pacientes realizavam serviços de limpeza (mais para o lucro do hospital do que para fins terapêuticos). Ali ela desenvolveu projetos de terapia através da pintura, escultura entre outras coisas. Inaugurou, desta forma, o Setor de Terapia Ocupacional. E foi a partir da reunião de todas as obras feitas no setor que Nise fundou o museu.
Um novo olhar sobre a loucura estava sendo construído. A concepção de que a esquizofrenia ultrapassa todas as barreiras taxativas da loucura como um fator identitário, limitado de qualquer potencialidade que não pertença ao seu âmbito. Através das obras feitas nos ateliês segundo Jung (terórico de Nise) as mãos podiam dizer aquilo que se passava no inconsciente, e que muitas vezes não conseguiam expressar em palavras.
A experiência foi maravilhosa para mim. Principalmente porque desconstrui a visão de que o louco é um sujeito excêntrico e confuso, que possui atitudes peculiares. Junto a área do Museu Nise fundou o hopital psiquiátrico Casa das Palmeiras. Local que tem características diferentes dos outros hospitais: as portas e janelas são abertas, não há enfermeiros, a frenquência diária é de pelo menos cinco horas, os terapêutas não usam jalecos e assumem uma postura de estar sempre ao lado dos chamados "clientes" fazendo também as atividades. Tivemos contato com alguns deles na área de recreação. No primeiro instante não soube julgar quem eram terapêutas e clientes, todos nos recepcionaram muito bem e pareciam animados com nossa chegada. Vimos obras maravilhosas, desenhos ricos em detalhes, esculturas belíssimas e outras coisas.
É claro que não poderia deixar de comentar sobre o fato mais importante pra mim dentre todos os que vi. Um dos internos escreveu uma poesia e nos deu de presente. Tenho que confessar que me emocionei. Transcreverei para vocês:
"A loucura da imaginação; Um conflito do real; Se uma história é contada com inoscência; Com os argumentos da verdade; Quando você acredita em uma versão de que não conhece a realidade, como por exemplo; A mentira não passa a ser verdade quando você acredita; Assim não é sua história de vida".

Logo depois fomos ao grupo de estudos realizado semanalmente no museu. Lá tivemos contato com a história de Nise e, é claro, com a teoria de Jung. O grupo é aberto para profissionais, internos e visitantes. Conheci também um antigo interno, chamado Milton Freire, que passou pelos antigos hospitais psiquiátricos e que hoje, a partir do trabalho feito na Casa das Palmeiras participa da luta antimanicomial e divulga seu livro de poesias chamado "Vida, Poesia". Deliciem-se com uma das poesias do livro:
"Que lugar é esse; Onde se desaprende a linguagem; E do qual quis falar? ; Que lugar é esse Onde se é mortificado? ; Falar, dizer A partir desse lugar, Prisão, cemitério; Campo de concentração? ; Que estranho lugar, Lugar nenhum, Onde habitei E que me habitou e que marcou para sempre? ; Por que demorei tanto a sair desses lugares em mim? ; Menino, voz de mulher Marciano,trovador. Meus personagens; Articulam-se, ;Para um dia te encontrar felicidade."


O trabalho feito por Nise da Silveira, sem dúvida, abriu as portas para que os esquizofrênicos fossem vistos de maneira dirente. O mais importante disto tudo é lembrar de que a loucura não deve ser vista como produtora apenas através de pintura, música, esculturas, poesias, etc. Sua dimensão estaria novamente limitada se estivesse ligada apenas a isso. Ela deve se expandir sobre todos os campos que consideramos pertencentes a todos nós.

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Ensaio da Aquarela Ensandecida

O colorido quem faz sou eu.
Na arte de ser é que pinto a tela branda de coração puro.
Eu quero é mais esse carnaval dentro de mim.
Eu quero sim
Uma flor pintada de roxo na testa,
Um nariz redondo vermelho,
Uma harpa dourada roubada dos anjos.

Eu quero traços vivos no sentimento daquele que vive essa bagunça policromática .
Que ainda exista o preto e branco no meio disso tudo
Porque sem eles não se completa a paisagem
E que a fantasia se expanda e invada todos os asfaltos cinzentos e os rostos tristes.
Eu quero luzes, barulho, vento no meio dessa passagem.

Se disserem ser doença da cabeça,
Então eu tenho loucura em mim.
Pois sou fiel ao meu próprio espetáculo.
Eu dirijo, protagonizo, assisto, bato palmas e espalho alegrias.
É neste circo que vou brincando com a felicidade.
Experimento dos desatinos do amor de verdade.
Eu quero o enredo da vida pra tocar na música de fundo.

E quero uma faixa amarela escrito: “TENHO O SENTIMENTO DO MUNDO!”

sábado, 1 de maio de 2010

Metade

Que a força do medo que tenho
Não me impeça de ver o que anseio

Que a morte de tudo em que acredito
Não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que eu grito
Mas a outra metade é silêncio.

Que a música que ouço ao longe
Seja linda ainda que tristeza
Que a mulher que eu amo seja pra sempre amada
Mesmo que distante
Porque metade de mim é partida
Mas a outra metade é saudade.

Que as palavras que eu falo
Não sejam ouvidas como prece e nem repetidas com fervor
Apenas respeitadas
Como a única coisa que resta a um homem inundado de sentimentos
Porque metade de mim é o que ouço
Mas a outra metade é o que calo.

Que essa minha vontade de ir embora
Se transforme na calma e na paz que eu mereço
Que essa tensão que me corrói por dentro
Seja um dia recompensada
Porque metade de mim é o que eu penso mas a outra metade é um vulcão.

Que o medo da solidão se afaste, e que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável.

Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso
Que eu me lembro ter dado na infância
Por que metade de mim é a lembrança do que fui
A outra metade eu não sei.

Que não seja preciso mais do que uma simples alegria
Pra me fazer aquietar o espírito
E que o teu silêncio me fale cada vez mais
Porque metade de mim é abrigo
Mas a outra metade é cansaço.

Que a arte nos aponte uma resposta
Mesmo que ela não saiba
E que ninguém a tente complicar
Porque é preciso simplicidade pra fazê-la florescer
Porque metade de mim é platéia
E a outra metade é canção.

E que a minha loucura seja perdoada
Porque metade de mim é amor
E a outra metade também.

(Oswaldo Montenegro)

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Todas as cartas de amor...



Todas as cartas de amor são ridículas.

Não seriam cartas de amor se não fossem ridículas.

Também escrevi em meu tempo cartas de amor,

Como as outras, ridículas.

As cartas de amor, se há amor,

Têm de ser ridículas.

Mas, afinal, só as criaturas que nunca

Escreveram cartas de amor é que são ridículas.

Quem me dera no tempo em que escrevia

Sem dar por isso cartas de amor ridículas.

A verdade é que hoje

As minhas memórias dessas cartas de amor é que são ridículas.

(Todas as palavras esdrúxulas, como os sentimentos esdrúxulos,

São naturalmente ridículas.)

Fernando Pessoa (Álvaro de Campos, 21/10/1935)

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Canção a céu aberto

Felizes mesmo são os pássaros.
Só eles sabem da leveza das penas planas sobre o mar de ventania.
Apenas eles se deitam sobre o chão que não existe.
E se guiam pelas estradas que não se vê.
Não há chegada e nem partida, apenas o caminho.
Experimentam o néctar e o gozo causado pela liberdade.
De pássaro se vive, o coração forte.
Ele sabe encontrar o mundo dentro de uma alma pequena.
Nem mesmo o medo e a maldade conseguem prender suas asas.

Felizes mesmo são os pássaros,
Pois só eles não conhecem a mentira, a falsidade, o ódio e a inveja.
E faz da planta pequena a sua casa.
Encontra no canto a salvação dos homens.
Guarda amor de baixo das cordas enferrujadas de um violão.
Canta de pés descalços sobre a terra fria e úmida.

Apenas o pássaros sobrevivem,
Porque se alimentam do silêncio das madrugadas, da onde se escuta notas baixas de uma canção.
Eles se aquecem das folhas das oliveiras nas noites de tempestade.
O céu ainda é pequeno para essas criaturas.
Os pássaros não morrem.
São eternos, porque só eles entendem das delícias e dos prazeres de se estar mais perto de Deus.



Dedico esse poema ao dono de um coração enorme. Meu orgulho e admiração. Meu amigo. Meu irmão Carlo.

Dia Urbano


Hoje, aqui do alto, tive a vontade de olhar o que se passava na janela.

Percebi nas ruas uma intromissão de barulhos estranhos, fumaça, muitos carros, gente apressada por toda parte.

Resolvi ver o céu. Ele parecia triste, meio acinzentado e as nuvens estavam tão embaralhadas quanto os carros e as pessoas nas ruas.

Em frente a minha janela havia alguém de pé olhando pelo gradiado de uma minúscula varanda.

Tinha um olhar introjetado e perplexo sobre a imagem que lhe alcançava os olhos que mal podia sentir minha existência frente a ele.

O caos da cidade nos inundou os olhos.