sexta-feira, 29 de maio de 2020

O Pedido

Ensina-me a fazer poesia?
Traços tortos, tão tontos quanto os nossos
Passos largos, sem calma nos espaços
Quero pisar onde não pisaria 
Assim em ti

Ensina-me a fazer poesia?
Com a mesma ânsia de todos os dias
Com a mesma sede que a alma teria
Sem mais
Ser Nós
Além

Ensina-me a ser poesia?
Feliz, sem medo da falta do abraço
Penetrando a superficie do aço de cada rima
Pra que se refaça sempre esse descompasso 

Ensina-me a ser poesia?
No entanto, nem de longe, nem atento
Não tire minha melhor teoria
Que anda dormindo por dentro
Mas faz tempo não aparecia 
E de súbito, ainda hoje, passou por aqui

segunda-feira, 4 de novembro de 2019

Um desabafo sobre os 30


Então já se foram 3 décadas? Assim tão depressa que nem me dei conta de que estou chegando a quase metade da vida de um brasileiro, segundo o IBGE...rs. Tenho recordações de quando eu tinha 10 anos, nas férias em Marataízes, em que eu brincava com minha prima. Éramos “adultas de 30 anos” e as nossas idealizações tinham uma certa pitada hollywoodiana de mulheres executivas muito ocupadas que falavam palavrões enquanto fumavam um cigarro. Então, 20 nos depois, me formei em psicologia, não virei executiva, falo alguns palavrões mas detesto cigarro. Acho que a Camila de 30 veio um pouco diferente. Tão diferente do que a de 10 pensava, diferente também das expectativas que a Camila de 20 tinha e muito diferente das cobranças das pessoas sobre quem tem 30 anos. Mas sabe de uma coisa? O fato de não corresponder ao que todo mundo espera de mim me ensinou tanto! Me ensinou que eu não preciso ser “bem sucedida” no trabalho, nem ter o carro do ano, nem fazer intercâmbio na Irlanda, nem ser casada e ter filhos ou ser “super malhada” e usar as roupas da moda enquanto tiro foto num hotel de luxo em Trancoso. Embora essas coisas todas sejam maravilhosas não são as únicas opções de felicidade. Um umas das "bênçãos" que os 30 me deram foi ser livre, livre de qualquer convenção social, livre de ter que corresponder uma sociedade chata e careta. O amadurecimento também foi outra coisa que me ajudou a entender que as pessoas podem ir embora das nossas vidas de muitas maneiras diferentes, que nem todas as grandes amizades duram  para sempre e que nem todos namoros valem à pena pra sua saúde mental. Me ensinou também que as pessoas podem se distanciar por muitos motivos com a vida adulta, mas que toda vez que a  música que lembre de você tocar ou quando passa a sua série favorita elas vão querer fazer contato para saber como você está. Além disso, aprendi que apesar de todos os problemas pelos quais a gente passe, o cara lá de cima vai sempre enviar um momento bom ou uma pessoa boa para compensar o seu dia difícil. Aprendi que pessoas pra criticar sua vida, mesmo sem saber nada, nunca irão faltar, mas no meio desse monte de gente você encontra sempre alguém pra te estender a mão ou emprestar um "ombro amigo". E não, com 30 você ainda não conhece tudo sobre a vida, talvez nem saiba ainda lidar com todas as barras, mas com certeza sabe pensar um pouco melhor sobre elas. E, aqui, eu descobri que o mais importante para mim é cuidar da minha autoestima, e que mesmo quando nada é do jeito que se imaginava, mesmo quando não se está nos seus melhores dias, é preciso buscar formas de se amar mais, de se querer mais e de ser bem melhor, porque é como já dizia Maiakoviski, gente foi feita para brilhar e que tudo mais vá pro inferno!



terça-feira, 13 de março de 2018

Diário de Bordo

Hoje, andei de bicicleta pela segunda vez entre os últimos sete dias. Já fazia um tempo que estava sem praticar este exercício. Aproveitei o convite do amigo e parti para encontrá-lo. Afinal, eu estava mesmo precisando de um pouco de equilíbrio e achei que seria uma boa metáfora para dar umas voltas por aí. A princípio, pensei nos caminhos em que poderia passar: "Quem sabe fugir da rodovia e passar pelas ruas laterais, atravessar a ponte e subir o tão temido morro até chegar ao bairro?" Passei pelas ruas traseiras, subi na bicicleta e fui como se fosse meu primeiro ensaio de voo. Aproximando-me do cruzamento, ouço alguém me alertando da curva, um motociclista passou por mim franzindo a testa. Então, me dei conta de que deveria ir para a esquerda e caí na real − eu não estava dirigindo um carro, embora não fosse tão ruim dirigir "meu carro" agora. Parei pelos carros estacionados, desci da bicicleta e fui guiando para chegar ao outro lado da rodovia. A tão planejada rota afundou como um barco furado, pois a rua do outro lado estava repleta de carros enfileirados no sinal e outros estacionados no acostamento, estrangulando-a ainda mais. Neste caso, o jeito foi seguir a rodovia mesmo - ainda bem que eu não era a única ciclista me aventurando por ali. Quando olhei para trás, havia um carro, e meu desespero fez apressar as pedaladas ainda mais. Logo adiante, pensei comigo:"Carros também devem respeitar ciclistas!". Portanto segui confiante de que mesmo me desviando do protocolo diário sobre evitar atividades muito radicais, não infringi nenhuma regra além das minhas. Foi então que, mais a frente, durante meu percurso, tive a estranha sensação de que minha bicicleta não tinha correntes. Sim! Estava tão leve e parecendo que eu fosse me atirar em qualquer muro ou carro que estivesse pela frente. Troquei uma marcha, em seguida outra marcha e...espere. O que é isso? Pedais mais leves ainda! Fiquei mais forte em sete dias?? Como é possível nenhuma marcha conseguir desafiar os meus pés? Pensei que atravessar a próxima ponte e passar entre outras bicicletas, carros desesperados, pessoas distraídas e carrinhos de bebê seria demais pra mim. Aqueles pedais pareciam evaporar embaixo das minhas sandálias azul petróleo. Diante de tanto, não me contive, não dava pra continuar, eu não me entendi com a "magrela". E revoltada a puxei pelo guidão e dei meia volta. Segui segurando-a com tanta raiva, que o sentimento transformou-se em angústia. Eu poderia ter ido. Se ela não estivesse tão estranha já estaria lá! Fui para casa pelo caminho da eternidade. Eu não avistava nunca o portão, dando assim mais tempo de curtir minha fossa. E finalmente cheguei em casa, sentei no sofá ainda vivendo a revolta de não ter ido. Foi quando dali olhei para varanda e avistei um guarda-sol disperso entre outras coisas, e logo pensei: "Acho que praia é o melhor pra mim". Me arrumei, peguei a canga, uma bolsa, o guarda-sol e parti em direção ao mar. O vento se desenhando com meus cabelos, sol queimando a pele e um mar azul lindo na minha frente: "Que sensação de ser infinito!". Entrei na água super gelada e pouco a pouco me banhava tentando me adaptar à temperatura. No primeiro mergulho subo e deparo bem na minha frente com uma tartaruga quietinha olhando para mim. Acho que sou a única pessoa no mundo a pensar que tartarugas podem querer morder nossos dedos do pé enquanto estamos distraídos no mar. Daí pensei, se ficaria onde estava ou me afastava, mas ela se foi.  E fiquei ali, esquecendo-me um pouco do meu medo de tartarugas, observando o horizonte e um barco que navegava. Este tinha muitas cores, todas elas vibrantes, uma enorme vela branca - daquelas que ficam quase azuis de tão claras com a luz do sol - e em baixo dele estava escito o nome de alguém que nem me lembro mais. O que importam os nomes? Só sei que as letras eram enormes "garrafais" pintadas à mão com uma tinta verde. E ele ia tão longe e à deriva fazendo o mesmo movimento que eu fazia quando as ondas tocavam. Naquele instante eu me sentia barco na imensidão de água e de dia.

segunda-feira, 12 de março de 2018

De Janeiro

A vida é tão inexata quanto os teus olhos caídos no dia em que nos despedimos.
Eu me prendia na confusão das minhas frustrações,
E você no silêncio das suas incertezas.
Diante de tanto, eu vou,
Deixo com que você vá também,
Aceitando os dias em que descobri que me cabe deixar ir.
Eu, que não sou de negociar com meu apego escorpiano,
me peguei passando uma rasteira em todos os astros
E me tornando cosmos.
Deixando a resposta de todas as estações pousar levemente sobre os ombros,
Para que assim eu possa seguir subindo em nuvens.

sábado, 17 de maio de 2014

A vista

De tanto tentar deixei que viesse sinceramente.
Todos os instantes permiti sua manifestação de mudez que aqui se insere.
A este repentino desafio que se faz presente,
Remeto-me a todos os instantes menos cabíveis.
Eu vendo,
Há quilômetros de distância todas as distorções do que me parecia mais exato,
Controlava tudo o que vinha ao meu redor, mas escorregava entre os dedos,
Com todos os gostos e sensações do que me apresentava.
E sendo,
Apenas aquilo que me projetava neste tempo tão saudoso,
Cheia de indagações mais trajadas de rebeldia inconformada.
Aqui por quanto? por onde? por quê?
Eu tento,
Voltar ao vazio e dar novos sentidos a minha epopeia súbita,
Mas entre cavalos, lanças e reinos o que me fará mais sábia?
Vestir-me com a armadura? Saber cravar a lança? Ou ter um bom cavalo?
Eu me atento
A cada instante, a cada hora, a cada detalhe
E ainda assim sempre me deparo com o nada.
Estes instantes, horas, detalhes não me deixam mais que retratos na parede.
Como voltar? E voltar me traz recomeço?
Porque se volto e rabisco tudo de novo, será que meu começo será começo?
Será que voltar é recomeço?
Será avesso?
Será que eu sempre tendo, sendo, atento chego a tempo pra pensar no que partiu?
Ou no que começou?
A única certeza é de que a tudo que me cabe,
Cabe minha história.










quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Sobre mim...

Eu simplesmente gosto da minha escrita esquizofrênica. Gosto da minha afinidade pelos contrastes, pelos adjetivos, pelas rimas mal feitas, pelas frases assimétricas. Quando eu escrevo, a ordem é mínima só porque odeio, abomino as regras exageradas das ditaduras dos textos formais. Escrita pra mim tem que ser leve. Tem que ser ato libertário, de se revelar, de ser o que se é sem medo de correções. Nunca fui uma ótima aluna em redação, nem venerei a gramática. Em contrapartida sempre amei as palavras, os sentidos, suas formas e contornos. Sempre me encantei pelo som em que elas fazem quando combinadas. Na melodia de quando tocadas pela garganta, boca, dentes. Pra mim é como se quase ganhassem uma materialidade e fossem sentidas na pele. E escrevê-las é como me desligar daqui. É como ser algo que eu não conhecia e me misturar entre outras coisas entre o que eu sou e o que eu até então não sabia que fazia parte de mim.

terça-feira, 7 de maio de 2013

Mãe Preta


Eu abri essa ferida foi pra você entrar.
Foi pra te carregar comigo como me carregava no embalo das minhas noites de insônia.
Abro o coração só pra não deixar escapar esse sorriso da moleca contadora de estórias.
De tanto rir me fiz também você e de todos os “vocês” que a vida me trouxe.
Hoje é da sua risada gostosa, da sua voz tão doce e das piadas mais puras é que eu me lembro.
E não mais da dor.
Não havia dor nos seus olhos, nem medo na sua voz.
Só havia você e nada mais.