terça-feira, 27 de dezembro de 2011

O Louco

Perguntais-me como me tornei louco. Aconteceu assim:

Um dia, muito tempo antes de muitos deuses terem nascido, despertei de um sono profundo e notei que todas as minhas máscaras tinham sido roubadas – as sete máscaras que eu havia confeccionado e usado em sete vidas – e corri sem máscara pelas ruas cheias de gente gritando: “Ladrões, ladrões, malditos ladrões!”

Homens e mulheres riram de mim e alguns correram para casa, com medo de mim.

E quando cheguei à praça do mercado, um garoto trepado no telhado de uma casa gritou: “É um louco!” Olhei para cima, para vê-lo. O sol beijou pela primeira vez minha face nua.

Pela primeira vez, o sol beijava minha face nua, e minha alma inflamou-se de amor pelo sol, e não desejei mais minhas máscaras. E, como num transe, gritei: “Benditos, benditos os ladrões que roubaram minhas máscaras!”

Assim me tornei louco.

E encontrei tanto liberdade como segurança em minha loucura: a liberdade da solidão e a segurança de não ser compreendido, pois aquele que nos compreende escraviza alguma coisa em nós.

(Khalil Gibran)

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Pela Vidraça

Eu ando meio cansada.
Cansada do que ainda não nem sei.
Só de pensar me traz mais espaço nesse vazio todo cheio de outras coisas.
Fico me perguntando se de fato me falta o que procuro,
Ou se o que penso em querer é que me anda dando meias-voltas.
Isso que acontece é quase tão inexpressível quanto esse dia nublado.
Fecho os olhos mais o nada ainda me traz mais angústias.
Os meus rodopios nessa valsa inacabada sempre terminam em náuseas.
Acho que por hoje a caça já foi suficiente.
Quero mesmo é ser eficiente pra esse desejo doente.
Eu me retiro por hoje.
Vou descansar pra acordar o sol.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Blog do amigo



O blog do meu amigo Gabriel Mathias está imperdível. Está aí uma boa opção pra viajarem mais no mundo das poesias e descobrirem novos talentos.
Acesse: http://poetizando-a-vida.blogspot.com/

sexta-feira, 4 de março de 2011

A Ponte

Eu acredito nessa pena branca que voa entre os teus dedos.
Porque é teu o poder que me transfoma em tudo que eu nunca vi.
Eu voo distante nestes teus braços longos.
E me envolvo nessa energia que me conduz...
Sou só tua ponte.
Deixa-me ser apenas isso.
A mim basta que seja o fio que liga-te aos outros pequeninos como eu.

Nasci madura daquilo que nunca conheci,
Daquilo que tu um dia me disse: Toma, é só teu.
Amo-te sem nunca ter te visto.
Amo-te porque além da minha crença tu me deste o privilégio de navegar por muitos rios.
Amo-te pelo propósito que me incumbiste.

Eu quero continuar sendo a ponte.
A ponte que um dia tu me mostraste.
Eu quero poder ajudar os outros pequeninos também.
Aqueles todos que foram esquecidos.
Aqueles que um dia tu me mostraste.

O teu riso

Tira-me o pão, se quiseres,
tira-me o ar, mas não
me tires o teu riso.

Não me tires a rosa,
a lança que desfolhas,
a água que de súbito
brota da tua alegria,
a repentina onda
de prata que em ti nasce.

A minha luta é dura e regresso
com os olhos cansados
às vezes por ver
que a terra não muda,
mas ao entrar teu riso
sobe ao céu a procurar-me
e abre-me todas
as portas da vida.

Meu amor, nos momentos
mais escuros solta
o teu riso e se de súbito
vires que o meu sangue mancha
as pedras da rua,
ri, porque o teu riso
será para as minhas mãos
como uma espada fresca.

À beira do mar, no outono,
teu riso deve erguer
sua cascata de espuma,
e na primavera , amor,
quero teu riso como
a flor que esperava,
a flor azul, a rosa
da minha pátria sonora.

Ri-te da noite,
do dia, da lua,
ri-te das ruas
tortas da ilha,
ri-te deste grosseiro
rapaz que te ama,
mas quando abro
os olhos e os fecho,
quando meus passos vão,
quando voltam meus passos,
nega-me o pão, o ar,
a luz, a primavera,
mas nunca o teu riso,
porque então morreria.

(Pablo Neruda)

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Colcha de Retalhos

Ainda que linha acabe e desacomode todos os pedaços de pano,

Junto pontas e ajusto bem os nós.

Tecer cada pequeno quadrado colorido com delicadeza trouxe minha angústia dos dias sem cor.

Dias em que os olhos se despediram de todos os carretéis e retalhos.

Vivo, hoje, despedaçada e misturada junto à poeira do chão.

Ainda que não haja linha onde as minhas mãos alcancem.

Ainda assim, desfazer-se não é fim.